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Mostrando postagens de março, 2018

AMAR TANTO NÃO É O PRINCIPAL; O PRINCIPAL É TOCAR

Amar tanto não é o principal; o principal é tocar. Todos temos sombras. O perfil muda; as sombras não; silentes são as sombras e a sós nos acompanham, quando estamos realmente a sós, nunca acompanhados, - até as sombras nos abandonam.  Conheces a tua sombra? Conheces a sombra do outro?  Amar tanto não é o principal; o principal é tocar. Só conhecemos uma parte, aquela que ficou, e só realmente conhecemos quando se vai. E esta vai te faltar. O amor não tem pressa, é a eterna criança-alada e quando se falta Amor, ganha-se uma alma. O amor é lição nova para nossas velhas emoções bárbaras e a poesia costuma ensinar o rebrilho da palavra e o amor pelo ajustado tom de nossa conversa em torno desse tema, onde há um destino de incerteza, é a poesia o que nos adianta e a sós nos avança. O Amor arde como o conhecimento e a perfeição de Leonardo, como o sol nos olhos de Galileu, como o Amor que move o Sol e as outras estrelas, que Boccaccio sobre a  Comédia mudou para a D...

QUE BICHO MAIS MISTERIOSO É AQUELE QUE ESCREVE?

Que bicho mais misterioso é aquele que escreve? Que bicho é esse que arruma letras em uma ordem? Rumar o incerto, agora cheguei a ti. Caio nas sentenças que então entre um ponto e outro. Tinha razão Dédalo, do labirinto só se escapa com o fio ou com as asas. Veja só onde me meti. Tenho que reinventar tudo, até criar um novo labirinto. Sinto-me nesta obrigação de deformar para formar, de torcer para ser compreendido. Pelo menos eu já me adiantei primeiro: isso aqui é para Ninguém. Só assim posso me entender ao me contradizer.  Estou nessa lista: todos os poetas mentem e é para a felicidade da poesia. Todos os poetas assumem a sinceridade de pedir licença à linguagem e depois ao sentimento. Ganham os que sabem tocar pessoalmente a corda do comboio. A poesia é o que gira a corda e faz o trenzinho ir. Em língua portuguesa, sabemos fingir, não é mesmo? Como na política, nos negócios, lícitos e ilícitos, na arte. E olha aí mais um fã de um dos mais irregulares dos idiomas. Eis-me esc...

TODO DIA ENFRENTAR A MORTE

Todo dia enfrentar a morte, o último exílio, praticar o mortal círculo da vitalidade. Todo dia renascer a palavra. Todo dia ser alguém que já foi e novamente ser o outro de si mesmo. O ciclo vital não exclui morrer e viver, morro agora para viver o risco de viver e morrer novamente. Na adversidade, esperei; na fartura, temi. Não sei que nome posso dar ao que escrevo, assim está melhor, terei segurança nesta parte que me é insegura, entendes? Assim posso ter o que é meu nesse jogo com o desconhecido. Sei que a palavra mais bela pode ser a mais falsa e que a palavra mais feia pode ser a mais sensata. Escrever bonito pode ser uma forma de esconder outro tipo de miséria, a ilusão do belo diante do destino que nem os deuses podem evitar. Prefiro escrever por inícios que é como o primeiro homem diante do ato de lembrar quando seu único recurso é a escrita; o primeiro a rabiscar com o carvão, o primeiro traço em algum canto de uma caverna, como agora esse papel é a caverna ou a memóri...

QUANDO ESCREVE, TODO HOMEM OLHA PARA TRÁS COMO ORFEU

Quando escreve, todo homem olha para trás como Orfeu porque sempre se perde o que se cria e é da natureza de quem cria desafiar e despedaçar-se - nesse ofício, pois foi ele quem ajuntou os homens, deuses e animais na sua função de aglomerar e de partir, abrir novos rumos e descer ao invisível, - o Hades, um lugar para não impressionar, mas de comover, de nada lembrar, mas de retornar e de nada trazer.  Eis o poeta. Escrevemos o que perdemos, e assim, deixo fluir essas linhas como o rio que me ensinou a ir só para frente, e me mostrou que retornar é o mesmo caminho – o de a água purificar - e quando se pode acatar os remansos, essas estranhas curvas e suas forças para dentro, escrever é anunciar uma existência que está para surgir e não para ficar ou insistir. E cada letra que cai desenha o seu próprio destino, em sua forma de nada ou de tudo e entre essas duas palavras, o poeta a dizer de Alguém para Ninguém, em seu persistir. Francamente, escrever é uma forma de aceitar o ...