A expressão "Carpe Diem" (a pronúncia latina: cárpe díame), traduzida como "aproveite o dia", é de Horácio ("Óratio"), poeta que viveu a época na qual a poesia tinha esse tom elegíaco e menos declamatório, - o lírico a tocar os temas inexoráveis que causam desconforto à vida, como a morte ou as soturnas sortes do destino - textos sempre -carregados de uma divina espiritualidade reconfortante.
- uma poesia filosófica e espiritual.
Admirar Horácio é alentar a alma das coisas que não podemos mudar. O poeta das famosas Odes entendia que as musas existem como espírito e que nos ouvem e elas têm comportamento próprio para cada situação. Cloe (a pronúncia latina seria “Clóe”) era uma delas, as outras eram:
Lydia,
Clio,
Cloris,
Licia,
Neera.
A musa é essa companhia que em silêncio te escuta na profundidade da alma o alento de cada verso. A poesia é a arte mais misteriosa porque inclui a música, dizia Jorge Luis Borges.
A seguir, um poema meu que imita Horácio, confessando à fictícia "Cloe" lamentos que, na verdade, se transformam em filosofia, texto aparentemente carregado de uma misantropia, essa aversão à humanidade, como muitas vezes, Horácio escrevia, na verdade, distanciando-se do convívio humano para pensar e escrever, principalmente quando o tema era sobre a brevidade da vida.
E sobre essa questão do distanciamento para com a humanidade sobra tempo, portanto, para conhecer a natureza, e deveras a nossa também natureza humana.
Afinal, há dias em que o mar está insociável, diria o poeta, há dias em que o vento está revolto, a natureza tem lá seus momentos de ira, tem lá seus arroubos.
E novamente o tempo que passa e o que realmente fica?
O tempo passa para nós, não para a eternidade.
O saturnino deus romano do tempo é corrosivo.
Era assim na religião deles.
E o deus Saturno, o Senhor do Tempo, está de volta, desta vez para reger, como planeta o ano de 2024, e nos cobrar responsabilidade, amadurecimento, justiça, estrutura e senso de realidade - essas mesmas qualidades observadas à época de Quintus Horatius Flaccus, o nome completo do poeta.
- Carpe Diem.
A mitologia é o nome que damos à religião dos outros, diria Joseph Campbell e poesia é aquilo que fica, o que é fundado pelos poetas, escrevia Hölderlin, o poeta alemão que imitava a sintaxe grega e latina em suas germânicas (e gregas e latinas) Odes.
Há uma larga tradição (de "tradere" - trazer) uma técnica de compor a poesia - e como é bela a dramaturgia da ficção poética, e nisso os romanos entenderam-na melhor do que os gregos, que não tinham uma palavra adequada à ficção.
Os gregos falavam da mímesis (imitatio, imitação); e por sua vez, a ficção (fictio, fictionem, fingere, fingir) só veio depois, com os latinos.
– Sim, Cloe é a musa imaginária do poeta que transforma as irreparáveis perdas ao tempo à divina alegria do fugaz presente.
NÃO CONFIA NADA A NINGUÉM, CLOE
Não confia nada a ninguém, Cloe,
Que pouco dura na humana memória.
Só o coração é sepultura
Do que sentes na dor ou na ventura.
Portanto, evita o gládio
Dos amores e toma
O momento presente como verdade
- O mais, a névoa baça
Como a incerta esperança
Do mesmo sol do passado
Dourar as promessas do futuro.
Ao tempo só pertence este segundo
Que o perdes, Cloe.
Colheo-o enquanto passa.
(Benilton Cruz, Poemas Horacianos. O Autor é professor e pesquisador de Literatura da UFRA, e membro da Academia Maçônica de Letras, cadeira nº 11, patrono: Mário de Andrade).
As "pedras de toques", expressão criada por Ezra Pound, e muito usadas no Brasil por Mário Faustino, eram citações de versos que muito chamavam a atenção de quem lia a obra de um poeta.
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