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ANTOLOGIA POÉTICA - ABAETETUBA

 ANTOLOGIA POÉTICA - ABAETETUBA

- Lançar um livro no meio de uma pandemia mostra o interesse de dar ao leitor um presente diante de tanto sofrimento.
- Eu e o poeta Garibaldi Parente, também de Abaetetuba, lançaremos em breve a ANTOLOGIA POÉTICA ABAETETUBA, que além de uma seleção de poemas em prosa e verso é também uma singela homenagem à nossa cidade natal.
- E deixamos uma amostra do livro e ebook a serem lançados em junho, com as belíssimas fotos de Rosangela Aguiar, dos autores e da cultura do miriti de Abaetetuba.



1. ABEIRANDO O LUAR


Garibaldi Nicola Parente




ALVORADA

 

             Para Luiz Solano

 


Eu, eis-me aqui!


Personificando o que não sou.


Leva-me o vento no ventre


ao Engenho de cana doce.


Meu pai sol,


minha mãe lua.


Aqui a terra nua,


vem nutrir-me com tudo que trouxe.


Gira a moenda


moendo gira.


No fado e na lenda


canta e suspira


a história de um grande amor.


Ó minha ribeira


do rio celeste!


De tudo que trouxeste


não perdeste 


do pé de cana a flor.





CINCO HAIKAIS

 

Verde clorofila

planto árvores seculares

animália em ti.

*

Ágrafo parágrafo

nuvens com vento de ti

colchete no céu.

*

Constelado amor

estelas vindas do além

fogo corpo a corpo.

*

A língua da mata

fala com os passarinhos

salvias flor a flor.

*

As chamas do beijo

focam no fogo brejeiro

labiais eretos.

 


BARCAROLA

 

Vou cantar a Barcarola

aviso as estrelas do mar.

E peço às estrelas do céu

que desçam a navegar.

 

No céu a estrela celeste

no mar a estrela marinha.

Uma de nuvens se veste

a outra no mar se aninha.

 

O mundo quer esplendor

mais amor o mundo quer...

Uma que brilha a outra não.

 

Céu e mar um só infinito.

Que juntas possam brilhar

no teu no meu coração.

 



2.

NO MEIO DO TEU CORAÇÃO HÁ UM RIO

Benilton Cruz



SEMEAREI O RIO

 

Semearei o rio

que é o lugar

onde posso ter

o verso que me escapa,

e o tempo

que não quer ficar.

 

Semearei o rio

que é o lugar

onde a morte

detém-se

em alguma parte.

E, ligeiras, suas

águas movem

do tempo a fria

eternidade

que a deixarei contigo

em alguma margem.



ABAETETUBA


I – Da chegada

 

Uma baía, uma tempestade, uma margem

A surgir qualquer miragem, uma promessa

E a segura terra, uma beira, a outra margem.

O primeiro abaetetubense salvou-se pela fé

E a cidade assim raiou

Sob um manto azul

Da Conceição-Mãe

- Imaculada

 

 

II – Cine Imperador

 

Já à tarde ia pelas ruas o carro e o alto- 

falante

O filme mais esperado do ano

Sessão às 15, às 19 e às 21 horas.

O cinema começava na rua.

Depois lá do alto, outro alto-falante,

a sétima arte começava com música,

E ainda anunciava: “Cidade no fundo do Mar”

Como perder esse filme,

Se de um rio é feita esta cidade?



III – Ponte Italiana

 

Em forma de casulo

Ali, o ponto de encontro

À manhã para o café

À tarde para o banho

Ou o jogo de damas.

Havia ainda um resto de praia,

Futebol era jogar bola,

E a gente brincava entre pedras

Antes do sol se pôr como prata

Ou ouro.

 

IV – Praça da Matriz

 

A igreja severa e serena

Aponta para o céu

Como uma pequena montanha

Deus está no centro

E todos os caminhos levam

À Mãe-Maria.

Nesta praça há um cruzeiro

Ou um calvário

Gólgota de pedras

Entre velas e dinheiro.

 

V - Maratauíra

 

Vou decifrar um mistério: tudo é água.

E tudo passa, flui e reflui na volta. Este rio

ensina que é preciso passar.

Nada se repete, mas tudo pode retornar.

 

E agora, enquanto lês essa página,

As águas deste rio viram esta margem mudar

Ela é a própria sucessividade

E encontra o que não quer passar.

Entre o rio e a rua

- A cidade.


VI – Colégio São Francisco

 

Ali, no canto ao lado da igreja matriz

Depois da praça, para quem vem da beira

Antes da aurora, ainda, a manhã e a feira

Tio Mano ajeita o óculos na ponta do nariz

E cedo tem a testa mareada da vida

É mais um incansável, que, recurvo, fez esta

cidade

História que se conta e é impossível esquecer

Vende seus pastéis, caracóis, sucos e sonhos.

 

VII -  Rua Justo Chermont

 

A primeira rua toca o rio

E a terra insegura cede à correnteza

E ao raspar o aterro

O barro de novo no rio se dissolverá

Nesse diálogo a cidade se fez

Toda manhã, chega e parte alguém,

Seu Bernardino às seis em ponto,

Abre seu armazém de Ferragens.

 

- Todo dia essa rua quer ser um rio

E todo dia o rio quer ser essa rua.



                                              Fotografia: Rosângela Aguiar

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