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O SÉTIMO FAUSTO

 

 

 

 



                              Lima - Peru - Cerro de Las Cruces -
                    Local do acidente aéreo que vitimou Mário Faustino.

                                          

                Foto do autor do livro, em 2016.

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Benilton Cruz

 

 

 

 

 

 

 

 

 

BELÉM – PA

2020

 

 


PRÓLOGO

 

 

Sete bois no escudo de Ajax.

Sete cidades para Homero.

Sete aberturas no corpo e no coração.

Sete céus, sete almas, sete anos do bom amor,

sete dias, sete vidas, sete portas, sete filhos,

sete sábios, sete palavras no calvário.

Sete cores, sete maravilhas, sete braços no candelabro.

Sete igrejas, sete sacramentos, sete selos, sete cabeças,

 

sete faces, sete palavras para Mário Faustino.

 


 

 

 

Estava lá Mário, que abraçava

o leitor, secreto personagem

do único livro que a hora assinalava

na madrugada de um mês assassino.

Novembro, estava lá, com uma cordilheira,

diante da morte, no vôo que o destino evitava

 

− em pedaços que o mito amortalhava.

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                              Amar, fazer, destruir

                                     MÁRIO FAUSTINO

 

 


          

O PRIMEIRO FAUSTO 

 

            ORFEU


 

O ABRANDAR DAS FERAS

 

A palavra é o começo.

A palavra é o fim.

Escrever, finalizar.

Encontrar sentido.

Escrever, fugir.

O que criamos pode nos destruir.

A beleza, resistir,

continuar.

Nomear o que não existe,

Chamar, apagar.

Escrever e assinalar.

Todos os verbos, ilusão.

A linguagem, uma contramão,

Desistir, continuar.


 

 

A CABEÇA

 

Despedaçado, a existência recolhe os fragmentos.

Deixaram-lhe a voz na cabeça.

A cabeça flutua porque fala.

A voz sopra os seus conceitos.

Nem sempre tudo tem sentido,

mas tem sentido o que um pescador procura.

 

O rio tem duas margens.



          PARA UMA MULHER DA ILHA DE LESBOS

 

Orfeu havia se casado com uma Hamadríade

e ao ir ao mundo de baixo, para buscá-la da morte,

a natureza não lhe pôde mais seguir.

Foi aí que nós nos separamos dela

para trilhar um caminho próprio do homem

e não mais o da divindade,

quando é o amor que manda na morte.

 

Safo, por sua vez, não desceu ao Hades,

Mas se precipitou, pelo Amor de Faonte,

do promontório de Leocádia e não mais voltou.

O que retorna não é perfeito.

Não olhou para trás.


Desde então a poesia decifrou os deuses

E dois são os seus mistérios:

É falso o que se escreve.

É verdadeiro o que se lê.



UM FRAGMENTO ATRIBUÍDO A ORFEU

 

Dizer, como a música não disse.

Cantar, como o silêncio não cantou.

Amar, como os deuses não amaram.

 


O SEGUNDO FAUSTO

 

        HOMEROS

 

(POESIA-EXPERIÊNCIA)


ILUDIR DOS VERBOS

 

O poeta são todos e mais um.

Estava lá Mário, que abraçava

a palavra de Homero, um pretexto para Aquiles,

sua ira e a cítara, a música de Orfeu, despedaçada.

Estava lá seu lábio e seu sudário,

no verso toda linguagem, toda palavra e cada

iludir dos verbos, desaprender os nomes

amar esse mar e esse rio, e essa morte

do feliz mês que me assassina :

a faustina carne de escorpião que me domina.


O POETA PROMETEU

 

CENA I

PROMETEU DIANTE DE HERMES:

 

Não dou meu fígado e sim meu coração,

Do meu peito aberto ao Cáucaso,

Aceite minha dor perene que a inteligência

Nada pode diante da fatalidade,

e Júpiter também não escapará do destino.

Este é meu segredo.

De minha discrição depende o fim de meus tormentos

Eu, que não posso morrer, terei que ignorar ou saber!

Aceito a ilusão da criação, em troca da liberdade

Estas correntes ficarão com os homens,

Elas nomearão o Fogo, que é o seu novo Senhor. 

Atribuí valioso fator de criação em cada sílaba

e adiantei-me ao Poder para criar a imagem e a semelhança.

Frente aos deuses, o Homem é o preclaro filho do Sopro e do Barro.

Meu nome prevê, não promete.

Agora, um deus será menor perante os homens

porque forjamos a palavra, que ocultei em uma palmatória:

ensinei a transgredir, como um bom professor, a raça do gênio promissor.

Por isso nada me pode humilhar, nada nos pode abater.

 

CORO:

Sou Prometeu, sou Poeta, a raça humana me vingará.

Antes de mim eram formigas, depois de mim

serão semelhantes aos deuses.

 

 

RECADO DE ZEUS PARA PROMETEU

 

HERMES: Acatarás a Idade do Ferro,

Na qual a honra será trocada pela fraude

e a verdade pela cobiça.

Um novo deus é sempre severo.

A memória tem belos cabelos.

Por baixo das raízes é fecunda a terra.

É a hora do homem caminhar com os próprios pés.

 


PARA O MENINO QUE QUERIA CORTAR O SEU CORAÇÃO EM ALTO-MAR

 

García Lorca morreu como um menino: o seu crime foi incitar as gaivotas e o trabalho prateado das formigas.

Do seu sangue, o crepúsculo era jovem e a manhã azulava com cheiro de pólvora,

para abençoar as oliveiras

para silenciar o melro

para inclinar a papoula de volta para a meia-noite.

Era de sua nuca que sangrava aquela madrugada de agosto.

 

O homem é a imagem de Deus.

Deus é a imagem do homem.

Por isso sua memória será a do guardião de borboletas.

Um pranto por García Lorca às cinco horas da manhã.

Pelas cinco horas da manhã de todos os relógios.

Pela última frase escrita com o sangue moreno do seu peito andaluz,

pela lua cigana e pelos olhos de lua dos cavalos de Granada

e pela memória do amante menino que queria cortar seu coração em alto-mar:

Um pranto por García Lorca às cinco horas da manhã,

às cinco horas da manhã de todos os relógios.

 

Um pranto, ainda que não desperte a maçã,

ainda que o orvalho não deslize mais nos vidros das janelas,

ainda que a aurora seja somente para as serpentes.

Um pranto, antes de rodar o girassol

por seu corpo que nunca foi encontrado,

porque era feito da mesma substância dos pássaros

da mesma substância das palavras.

 

Um pranto por García Lorca às cinco horas da manhã,

às cinco horas da manhã de todos os relógios.


CANÇÃO DO VIAJANTE

                               

                             Imitação de Goethe

 

Eis aqui o papel,

Eis aqui o lugar

Para cair as palavras.

Eis aqui a tua morada

Debaixo da asa.

 

Eis aqui o princípio

E a partida.

Eis-me sem lugar, passando

Debaixo da tua casa.

 

Escuta, as aves acomodam-se

Nas árvores serenas,

A estrada termina na escuridão

Espera mais um instante apenas

      Descansarás com este livro na mão.


UM POEMA HORACIANO

 

Deponho as armas, Lídia,

E te venero – que me atinge

O golpe mais fatal :

O coração que livre quero.

 

Não me perderei por outra

Que não seja a tua e a minha

liberdade.

Vem! Que só irei repetir

Que a ti é certo,

Meus próprios cantos

Que por ti são meus versos

e a eternidade.

 

Deponho o Louro, Lídia.

Se de que adianta ter a glória,

Mas não o Amor, em teu alvo colo,

Onde mais feliz vivo

Que o rei da Pérsia.



    O TERCEIRO FAUSTO

 

A LINGUAGEM

 

 


CONJURAR ESSES VERBOS

 

Inventar lucidez, dar sentido às coisas

que não têm nenhum. O que sabemos é uma

forma de imaginação e se sonhamos

é porque não sabemos. A razão começa

com um pensar e bem poderia

assim começar:

 

“Vida, toda linguagem”

 

eu a levo com versos

que a luta mais vã é com as palavras

por isso se desiste ou se canta

ou se ergue contra

Como é o meu caso

que a probabilidade

é mais ou do que ser

 


Conjurar esses verbos,

absolver esses nomes:

 

amar, fazer, destruir.


     ESCREVE-SE PARA FUGIR DA CRIAÇÃO

 

Escreve-se para fugir da criação.

É uma experiência que nos coloca

na contramão da linguagem, no exílio e à margem.

Por isso todos experimentam e poucos persistem.

O verso foi a memória, que memória

o verso deve cantar agora?

A memória gosta de destroços ou de pedaços

O indivíduo é seu pior embaraço.

e a palavra revelou-se Nada. 

E Nada é essa combinação

cujo cofre está fechado para dentro

e a chave mal começou a abrir.

Qualquer palavra é mera combinação.

E essa não interessa.

A que quero é a contracriação.

É cuidar em não se enredar.

Enredar par quê? Tecer é prender.

Eis o contratexto. Eis o poema ou o antipoema.


Desista do texto leitor, porque eu já desisti.

O texto só tem texto. Falácia.

A poesia não tem guia,

não tem fio, nem asas.

O labirinto, o vazio, o cão-guia para cegos.

Poesia não é nada.

Não pode ser nada.

A poesia luta contra os perigos de ser.

Luta contra os dragões camuflados de pássaros

que a levaram ao reino do que é possível

e do que é impossível.

Ilusão como o paraíso.

Como persistir com o que nos acena

e nos humilha?

O que é a palavra senão uma persistência?

Uma outra que quer mudar para outra e Nada ser.

A palavra, uma mentira que se mutila

com criação.

 


O NADA

                    

É o que nos destrói

Sem nos tocar.

Nada cria nada

e insistimos fazer

nada fica do nada

para depois de nada existir

nada encobre nada

para onde há de se ir?

O que fica é o que não está.

A companhia é adiar,

o amor é recuar

e a vida, um arrumar.

    O verso não é confiável

o verso apenas avisa,

Que só há o embate:

nada versus nada

vida versus verso.


Verso, o que queres

Além do grito?

além do mito?

Velha fábula.

Nada ouve nada

Como inventar

com o que é palavra

um sopro, um risco

um nada que se cria

com nada

 


   O QUARTO FAUSTO

 

O AMOR

 

 

 


O MUNDO QUE PERDI

 

O mundo que perdi deu-me um clamor,

Um vazio perigoso, esta palavra

A órbita da esfera que me escapa.

O mundo que perdi deu-me um clamor,

Canteiro de nuvens sobre terra escarpada,

Calmaria de oceano sobre abismos de nada,

Sub e sobre linhas que goza a palavra.

O mundo que perdi deu-me um clamor,

Clamor cujo leito espuma o vinho ácido,

Clamor da garganta que fala quando cala,

Clamor que adormece o tigre, e se dispersa.

E basta não haver dito para que rumine

O esplendor da derrota que me ilumina.

 

 

 

 

 


NÁUSEA NAVE

 

Náusea é a nave dessa viagem

Em que escreves no que és escrito,

Interjetivo, versos, verso,

Que enjôo e desisto.

 

A vida é a língua e sem adjetivo, a coluna partida.

É o verbo que semeia e não a carne, áspera,

postulada pelo dia.

 

Ó sêmen maduro,

Aqui e ali, diverso.


NESSE JARDIM

 

Aquiles e Heitor,

Saul e Davi,

Os seteiros e Sebastião,

O Arcanjo e Adão

 

Judas e Jesus.


O QUINTO FAUSTO

 

A MORTE

 

 


NA FAUSTINA MORTE DE MÁRIO

 

Na faustina morte de Mário

não há cadáver, há espaços,

como a vida, a memória.

A morte é a última forma do amor,

Um canto do coração, 

E suas vielas do ar. como a palavra.

A morte é quando renunciamos

Para não perder o que já perdemos.

Amor e morte, irmãos da recusa,

E da palavra

que posso Damas, dizer-vos, e a vós,

Senhores, O Cerro de la Cruz abriu

os braços e cerrou o verso

e abriu essa minha pobre língua,

e me deixou no lar dos sonos

Sob sete moradas,

Eu vi as sete bestas tão serenas,

sonhei a vida.

E vivi da morte.


A LÍNGUA NÃO VATICINA A REALIDADE

 

Pensar na morte ensina-nos a viver.

A Hora é melhor não saber,

Já que estamos condenados a esquecer.

Somos aves nascidas mudas.

E o grito ensinou a voz a escrever.

 

A palavra é torta, e eu me inclino todo mês

Sobre a língua que mal pressente

o fatal exílio. Mas, esqueçamos

toda porfia com a realidade.

Esqueçamos a língua que nos mata por lealdade

E assinala ao beco da tua agonia:

 

           A morte espacial que te ilumina.

         

          (Amén, amén vos digo)


É O VENENO QUE DÁ A VIDA

 

               Was bleibt aber, stiften die Dichter.

                                                HÖLDERLIN

 

É o veneno que dá a vida

É o abismo que dá as asas

É o medo que dá a crença

É a crença que dá o viço.

 

É a morte que dá a vida

É a vida que dá a obra.

É a realidade que dá a verdade

É a verdade que dá conta disso.

 

É a palavra que dá o mundo

É o homem que se adianta

É o poema que dá o troco

 

É a poesia que dá a poesia

É a palavra que dá e tira

É a poesia o que fica.


AOS SETE SONOS

 

A morte é o mais perfeito dos sonhos,

o repouso do guerreiro

no dorso do cavalo que domina

a Hora que o Agora faz partir.

 

A morte é o poder do silêncio,

a estranha paz e verdadeira,

o reconhecimento da natureza,

do olhar que se abre para enxergar.

 

A consciência inviolável e consciência

essa divindade humana que sofre

a rota ascendente do peregrino

e da morte que ama a vida.


           A MORTE DE DOM QUIXOTE

 

Vale saber, pois é uma maneira de morrer.

Decidir a consciência em prol da imaginação

que supera o que não quer morrer.

Um jorro de palavras para conter o ocaso de um país,

de uma religião, de um homem.

A morte ronda o existir como sua outra cara,

ronda a língua para não deixá-la morrer.

A morte é uma metáfora da vida.

É a casca e a moldura no quadro 

Do Nada que se desdobra a fantasia.

Toda obra são as últimas palavras,

toda obra é o que quer dizer o suspiro derradeiro.

Morrerei em minha cama como um bom cavaleiro:

Morre a criatura para que o personagem,

E o leitor vivam a emoção do verdadeiro.



O SEXTO FAUSTO

O Tempo


NOVEMBRO, A MADRUGADA

Há silêncio demais nessas montanhas.

O frio é a lâmina e a serpente, abaixo, um rio.

Que, lento, vai para não parar.

O frio é lunar, o rio, meu errar.

  E aqui deixarei minha última palavra

que é do éter, a única voz.

 

Se foi agora que comecei e me conhecer.

Não pergunte nada ao poema

e nem olhe para trás.

O homem é a resposta

E agora é minha Hora

  O tempo na verdade tem domínio

Não sou mais Mário

Tenho todos os destinos

E nada mais consigo lembrar.

Sou uma linguagem que a morte

Repetirá no crepúsculo e no ocaso,

Como este verso que agora acabo.

Apenas me antecipei,

Como em toda a minha vida,

entre a aurora e o meio-dia,

o que evitei a vida inteira:

sou um nome e uma Data

Sou um Homem e sua Hora.



CONTRA O TEMPO, ALMA ANÁRQUICA.

 

Não há o tempo, eu que criei a Quinta estação,

o décimo terceiro mês, o mais que bissexto ano,

as conjunções do agouro dos astros que deformam esta Hora

e as velas de ontem que dormem no abismo de hoje.

Recordei que o último dia de Heitor foi o de Tróia

e o ultimo dia de Tróia o de Aquiles.

Cobrei um outro tempo: o desta manhã em marcha.

O que me disse da silente eternidade

Foi este verão sonhado por abutres.

 

Amém, amém vos digo, tem domínio um tempo que convida,

Desde o princípio, à treva suficiente para o espírito

Mover-se à flor do sol em fuga para cantar:

Vivi em 32 anos tudo o que se pode viver em uma longa vida.


 

           O SÉTIMO FAUSTO

                    O EPITÁFIO

 

 

 

 All is could beauty; pain is never done

                                                                                                         JOHN KEATS

 

  

Todo poeta escreve seu epitáfio.

Este é o de John Keats: “Tudo é fria beleza; 

e nunca finda a dor”.


Mesmo que o tenha

escrito sobre a água,

nas invisíveis asas da poesia,

foi a música que lhe segredou,

o hino que ao fundo vai se perdendo,

e se repetindo, se partindo, 

à estranha sorte,

do sino que retorna para quem o repicou:


- o poeta, assim como o rouxinol,

não nasceu para a morte.


Benilton Cruz



O VENTO NAS ROSAS

 

O vento nas rosas corta as pétalas,

E sangram cristais nos lábios da manhã.

Novembro, com um melancólico sol, desperta:

— a lápide azul e um epitáfio no ar.

 

Assim, no hálito frio da canção

entre flores da montanha começou a arder

O homem não sabe a sua hora,

Pressente, sonha, acorda e ora.

 

Para que saber? Antes ou depois

arrumar a mala, fazer, o jogo é lançar

a sorte é uma palavra, frágil ou forte?

 

Para solapar a razão,  sua poesia ensinou

a luz a demorar o estranho lume do ocaso,

— Morreu aceso no coração da noite.


INFANTE COURAÇADO AR

 

Maior errância

Que a palavra

Não há

 

Noite, cavalos, sinos.

A prova é a signi-

ficância:

 

Oscilar, esse

Infante couraçado

ar.

 

 

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