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PAUL VALÉRY NA ESCOLA NORMAL



                                                                                   
                                                                             Texto de Walter Benjamin
                                                                                  Tradução Benilton Cruz
                                                                                                Revisão Gunter Pressler


Deve-se pensar nos seminários da Alemanha do Sul na época do Vormärz[1]  a fim de se ter uma noção das salas desprovidas de ornamentos da Escola Normal.  Napoleão fundou este instituto para uma elite como forma de assegurar a independência material diante de toda liberdade dos estudos. Nesta Escola Normal, Noberto Von Hellingrath, prematuramente morto, diretor em 1911, inesquecível editor de Hölderlin, assegurou também um lugar para o alemão. Dela também, o recém-falecido bibliotecário Lucien Herr, tradutor das correspondências entre Goethe e Schiller, foi um dos melhores conhecedores do movimento intelectual alemão. Boa parte da França científica provém dessa escola. Pasteur, Taine, Fustel de Coulanges e muitos outros foram gravados nos quadros de honra do “auditório”. A gravura dourada é o único ornamento desta sala pequena, escura e baixa. Nesta sala, Valéry assumirá a tribuna por meia-hora.
Devagar, sem chamar atenção, dirige-se à tribuna. A vontade arquitetônica trabalhou neste corpo. Seu gesto está para o tom de seus versos tal qual o dançarino para a música, e a elegância dá mil facetas geométricas à aparência dele. Instantaneamente surpreende e fascina uma contradição: tão brilhante está dotado bem marcante e rigoroso rosto, porte expressivo da figura envelhecida para impressionar as pessoas, mas sua voz e seu olhar deixam a desejar. O olhar é cortante como um caçador, porém desvia ao mundo ctônico, torto para baixo e para dentro. A voz soa, precisa, mas auditivamente perceptível por partes. Ela é um desafio para ser ouvida, como um texto em adivinhação a ser entendido. A voz não condiz com a fama, a idade e a sabedoria para criar um efeito direcionado para os 60 ou 70 jovens estudantes. Valéry, o qual, ganhou nos seus dias tardios aquilo que restou do canônico do poeta o que ainda está em vigor, nunca se posicionou sobre as questões públicas, e nem cortejou o povo pelo carisma. E nem hoje, mesmo como imortal recentemente faz isso. E tão preciso ele mesmo se distanciou do Simbolismo – o rigor de Mallarmé, se não fosse uma audácia que ainda vive em Valéry. Por isso é também significante, ao mesmo tempo, o soar crítico que vez ou outra aparece, quando ele narra da lembrança do auge tempo do simbolismo.
Por 40 anos, a grande preocupação deles todos chamou-se: Música. Literalmente rompimentos, "écrasé de littéralement", perdia-se todos os domingos  o Concerto Lamoureux no Champs-Elysées, quando rompia o grande Prelúdio de Wagner. O que nós nunca podemos, que ao lado apareça? Assim soa desesperado o grande diálogo Tannhäuser de Baudelaire em um novo gênero poético. Música tem sons, escala e tonalidade: ela pode construir. O que é o contrário na construção do poema? Quase sempre um simples driblar da construção lógica. Os Simbolistas buscam reproduzir a construção fonética linguística de sinfonias. E depois que obra-prima deste estilo teve sucesso, com Mallarmé, foi um passo mais adiante. Ele puxa a escrita para a competição com a música. Então ele leva de um dia de Valéry como primeiro antes do manuscrito do "Um lance de dados". “Vejam isto e digam-me, se eu estou louco! " (Conhece-se este livro da edição póstuma de 1914. Um quarto de volume de poucas páginas. Aparentemente sem regras, em muitas consideráveis distâncias, são palavras em estilos literário alternados de escrita distribuídas em cima das folhas.) Mallarmé cujo rígida contemplação viu em meio da construção cristalina sua verdadeira escrita tradicional o quadro real do vindouro, trabalhou ele, pela primeira vez, (como puro poeta) a tensão gráfica dos anúncios em tipos. Assim a poesia absoluta mudou no extremo no oposto aparente o que refuta para os Moderantisten (os moderadores), para o pensador ela apenas o confirma. Para Valéry, talvez, não obstante: "O dedo pode muito bem passar pela chama, mas não pode nela habitar”.



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[1] Período historicamente compreendido entre 1815 a 1848 na Alemanha. “Vormärz” significa literalmente “Ante-março”, ou seja, alude ao período que vai do Congresso de Viena, em 1915, até o momento que antecede a revolução elemã de 1848. Os gêneros literários mais cultivados por essa época foram cartas, relatos de viagens e os poemas políticos. Destacam-se, dentre outros, os nomes de Bettina Von Arnim, Heinriche Heine (algumas obras). Ferdinad Freiligrath, Friedrich Wilhelm Schulz e George Büchner.

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