Uma introdução e uma pequena seleção de poemas do Expressionismo alemão, traduzidos por João Barrento, no meu blog Amazônia Etnopoesia. No cinema, resumidamente, foi um teatro das sombras; na pintura, a melhor definição está com Edward Munch: "eu pinto o que vi e não o que vejo", e na literatura foi a mais social das vanguardas.
Foi a mais social de todas as vanguardas.
Algumas características do movimento, tanto na
pintura como na poesia, são: visões apocalípticas como decadência, ocaso da
civilização, guerra, fim de mundo, loucura e depressão – contrastando com
levante, revolução, esperança, felicidade, metrópole, realidade, juventude,
anonimato, novo tempo, novo homem - o
próprio século XX.
O traço característico é a força da expressão
nitidamente da crise e ao mesmo tempo da “inalienação” do espírito (em Trakl,
seu maior poeta; em Kafka, seu maior escritor). O Expressionismo influenciou,
no Modernismo do Brasil, a pintura de Lasar Segall, Anita Malfatti, Di
Cavalcanti; e, os poetas Oswald de Andrade e Mário de Andrade.
Benilton Cruz
ANTOLOGIA DO
EXPRESSIONISMO ALEMÃO
FRANZ WERFEL
Nasceu em 10 de setembro de
1890 em Praga. Freqüentou o liceu e datam desse tempo as primeiras tentativas
poéticas. Fez estudos comerciais em Hamburgo. Em 1912 foi para Lípsia, onde se
associou à editora de Kurt Wolff. Aí conheceu Walter Hasenclaver e Kurt
Pinthus. Este três autores formaram o pólo de concentração de poetas da geração
expressionista e de alguns da geração anterior. Entre 1915 e 1917 esteve na frente
de batalha. Casou com Alma Mahler em Viena, e viveu em Breitenstein e
Veneza. Em 1921 recebeu o prêmio
Schiller e em 1925 o prêmio Grillparzer. Em 1924 foi publicado o seu romance
Verdi, que iniciou a série dos grandes romances pós-expressionistas. Foi
obrigado a fugir para Paris em 1933. Escondeu-se em Londres, e daí conseguiu escapar para a Espanha. Em 1940
partiu de Portugal para Nova Iorque.
Morreu em Hollywood em 1945. Com seu livro Der
Weltfreund (O amigo do mundo) transformou-se num dos porta-vozes da geração
expressionista pelo seu caráter de irmandade e companheirismo.
AO LEITOR
Franz Werfel
O meu único desejo, Oh
Homem, é ter contigo afinidades!
Sejas tu negro,
acrobata, ou repousas ainda no fundo seio maternal,
Quer o teu canto de virgem
se ouça pelo pátio, ou manobres a tua jangada no brilho das trindades,
Sejas tu soldado ou
aviador pleno de resistência e de ânimo vital.
Trazias também uma
espingarda com banda verde a tiracolo, quando eras criança?
Ao disparar, saía do
cano a rolha presa, sem perigo.
Homem, meu semelhante,
quando eu canto a lembrança,
Não me resistas, vem
desfazer-te em lágrimas comigo!
Porque eu passei por
todos os destinos. E sei apreciar
O que sente a solitária
harpista na banda musical,
O que sente a tímida
governanta em estranho círculo familiar,
O que sente a
debutante, tremendo ante a caixa do ponto teatral!
Eu vivi na floresta,
fui funcionário do Estado,
Servi fregueses
impacientes, andei curvado sobre livros de caixa,
Estive como fogueiro em
frente de caldeiras, de rosto intensamente incendiado,
E, quando moço de
fretes, comi restos de cozinha, e o que mais se acha.
Por isso, pertenço-te,
e a todos os demais!
Peço-te que não tentes
resistir!
Oh, quem dera, Irmão,
que eu pudesse cair
Um dia nos teus braços
fraternais.
AN
DEN LESER
Franz Werfel
Mein
einziger Wunsch ist, Dir, o Mensch verwandt
zu sein!
Bist
Du Neger, Akrobat, oder ruhst Du noch in tiefer
Mutterhut,
Klingt
Dein Mädchenlied über den Hof, lenkst Du
Dein
Floss im Abendschein,
Bist
Du Soldat, oder Aviatiker voll Ausdauer und
Mut.
Trugst
Du als Kind auch Gewehr in grüner Armschlinge?
Wenn
es losging, entflog ein angebundener Stöpsel
dem Lauf.
Mein
Mensch, wenn ich Erinnerung singe,
Sei
nicht hart und löse Dich mit mir in Tränen auf!
Denn
ich habe alle Schicksale durchgemacht. Ich weiss
Das
Gefühl von einsamen Harfenistinnen in Kurkapellen,
Das
Gefühl von schüchternen Gouvernanten im
fremden Familienkreis,
Das
Gefühl von Debutanten, die sich zitternd vor den
Souffleurkasten stellen
Ich
lebte im Walde, hatte Bahnhofsamt,
Sass
gebeugt über Kassabücher und bediente ungeduldige Gäste.
Als
Heizer stand ich vor Kesseln, das Antlitz grell überflammt,
Und
als Kuli ass ich Abfall und Küchenreste.
So
gehöre ich Dir und Allen!
Wolle
mir, bitte, nicht widerstehn!
O,
Könnte es einmal geschehn,
Dass
wir uns, Bruder, in die Arme fallen!
ERNST STADLER
Nasceu em Colmar, na Alsácia, em 11 de Agosto de 1883. Estudou Germanística e Romanística em Estrasburgo e Munique, com uma licenciatura sobre Parzifal. Entre 1906 e 1908 esteve em Oxford. Em 1908 apresentou o doutoramento em Estrasburgo, dissertando sobre as traduções de peças de Shakespeare para alemão, por Wieland. A partir de 1910 foi professor na universidade de Bruxelas. Lecionou também em Toronto no Canadá. Foi chamado para o exército como oficial de artilharia e enviado para a frente de guerra. Morreu em combate, perto de Yper, em 30 de outubro de 1914. Foi um dos principais representantes da primeira fase da literatura expressinista, a que pregava o Novo Homem, cuja humanidade seria indiferente às classes sociais, daí o apelo à revolução interior.
A SENTENÇA
Ernst Stadler
Num velho livro topei com uma palavra escrita
Que como um choque me marcou e ilumina toda a
minha vida:
E quando me
entrego ao prazer embotante,
E à essência prefiro a aparência, a mentira e o
falso
semblante,
Quando, de ânimo leve, a mim mesmo me engano com
pequenos nadas,
Como se fosse clara a escuridão, como se a vida não
tivesse mil portas
brutalmente fechadas,
E repito palavras cuja vastidão eu nunca senti,
E agarro coisas cujo sentido profundo não vivi,
Quando com mãos aveludadas, o sonho benvindo me
acaricia
E do real quotidiano me alivia,
Alienado do mundo, estranho à minha própria
consciência,
Então ergue-se em mim essa palavra: Homem, torna à
tua
essência.
Ernst Stadler
In einem alten
Buche, stieβ ich auf ein Wort,
Das traf mich wie
ein Schlag und brennt durch meine
Tage fort.
Und wenn ich mich an
trübe Lust vergebe,
Schein, Lug und
Spiel zu mir anstatt des Wesens hebe,
Wenn ich gefällig
mich mit raschem Sinn belüge,
Als wäre Dunkles
klar, als wenn nicht Leben tausend wild
verschlossne Tore trüge
Und Wort
wiederspreche, deren Weite nie ich
ausgefühlt,
Und Dinge fasse,
deren Sein mich niemals aufgewühlt
Wenn mich
willkommner Traum mit Sammethänden streicht,
Und Tag und
Wirklichkeit von mir entweicht,
Der Welt entfremdet,
fremd dem tiefsten Ich,
Dann steht das Wort
mir auf: Mensch, werde
wesentlich!
ALBERT
EHRENSTEIN (1886-1950)
Filho de húngaros, nasceu em Viena; nesta cidade estudou História e Filologia, e licenciou-se em 1910. Publicou os seus primeiros versos na revista Fackel (O Facho). Através de Oskar Kokoschka ligou-se ao círculo da revista Der Sturm em Berlim e para lá foi viver. Depois da guerra, viajou pela Europa, África e Ásia e publicou nesta época poemas inspirados na lírica e prosa chinesas. Viveu a partir de 1932 na Suíça, e em Nova Iorque desde 1941; aí veio a morrer na maior pobreza. Segundo Oskar Maurus Fontana “Albert Ehrenstein... o homem e o poeta que em primeiro lugar visionou a ‘fuga sem fim’, e que não estava em parte nenhuma. Dos expressionsitas de Viena era ele o de escrita mais radical e de maior acribia de tom. Tal como foi, no todo da sua natureza, um inconformista, assim também foi o seu expressionismo.”
SOFRIMENTO
Como estou atrelado
À carroça de carvão da minha dor!
Repelente como uma aranha
Rasteja sobre mim o tempo.
Cai-me o cabelo,
Encanece-me a cabeça para o campo,
Para lá do qual ceifa
O último segador.
O sono ensombra-me os ossos,
Morri no sonho já,
Erva nascia do meu crânio,
Da negra terra era a minha cabeça.
LEID
Albert Ehrenstein
Wie bin ich
vorgespannt
Dem Kohlenwagen
meiner Trauer!
Widrig wie eine
Spinne
Bekriecht mich die
Zeit.
Fällt mein Haar,
Ergraut mein Haupt
zum Feld,
Darüber der letzte
Schnitter sichelt.
Schlaf umdunkelt
mein Gebein.
Im Traum schon starb
ich,
Gras schoβ
aus meinem Schädel,
Aus schwarzer Erde
war mein Kopf.
O POETA E A GUERRA
Albert Ehrenstein
Eu cantei os cânticos da vingança em vermelho
[rasgada,
E cantei o silêncio do
lago de baías arborizadas;
Mas ninguém se juntou a
mim,
Íngreme, solitário
Como a cigarra se
canta,
Cantei o meu canto para
mim.
Os meus passos vão-se
desvanecendo, extenuados
Na areia do meu
esforço.
Os olhos caem-me de
cansaço,
Estou cansado dos
desconsolados vaus,
De atravessar rios,
mulheres e ruas.
À beira do abismo, não
penso
No escudo e na lança.
Assoprado pelas
bétulas,
Ensombrado pelo vento,
Adormeço ao som da
harpa
De outros,
Para quem ela escorre
alegremente.
Não me mexo,
Porque todos os
pensamentos e ações
Turvam a pureza do
mundo.
DER DICHTER UND DER KRIEG
Albert Ehrenstein
Ich sang die Gesänge
der rot aufschlitzenden Rache,
Und ich sang die
Stille des waldumbuchteten Sees;
Aber zur mir
gesellte sich niemand,
Steil, einsam
Wie die Zikade sich
singt,
Sang ich mein Lied
vor mich.
Schon
vergeht mein Schritt ermattend
Im
Sand der Mühe.
Vor
Müdigkeit entfallen mir die Augen,
Müde
bin ich der trostlosen Furten,
Des
Überschreitens der Gewässer, Mädchen und
[Straβen.
Am
Abgrund gedenke ich nicht
Des
Schildes und Speeres.
Von
Birken umweht,
Vom
Winde umschattet,
Entschlaf’
ich zum Klage der Harfe
Anderer,
Denen
sie freudig trieft.
Ich
rege mich nicht,
Denn
alle Gedanken und Taten
Trüben
die Reinheit der Welt.
JOHANNES R. BECHER
Nasceu em Munique, e estudou
filosofia e medicina em Berlim, Munique e Iena. Seguiu depois a carreira das
letras. Ingressou no Spartakusband (liga
espartaquista). Elemento ativo do partido comunista, com influências diretas da
cultura russa. Emigrou em 1933 para Praga, e daí para Viena e Paris, vivendo na
Ex-União Soviética de 1935 até 1945. Redator, em Moscou, da revista de
emigrantes Internationaler Literatur. Regressa em 1945 a Berlim-Leste. Foi presidente
da Liga Cultural para a Renovação Democrática da Alemanha, e desempenhou
posteriormente outros cargos elevados. A partir de 1954 foi ministro da Cultura
da República Democrática Alemã. Foi um dos mais ativos escritores socialistas.
Morreu em Berlin, em 1958.
A NOVA SINTAXE
Johannes R. Becher
As bengáligas
borboletas adjectivas
Envolvem no seu canto o
substantivo de sublimes e
[pétreas estruturas.
Um particípio-ponte vai
vibrar, vibrar!
Enquanto o ousado
verbo, sonante aeroplano, se atira
[em espiral para as alturas.
Dança de artigos agita
airosa pernas bambolantes.
Em ritmadas risadinhas
baloiça-se a platéia.
E eis que uma estrofe
limpa, de metálico tom,
se solta do trapézio. A
cadeia
de luzes de arco na rua
desfaz-se em estilhaços.
Apesar da tão garrida
dama e do seu sagrado vocativo.
Um jovem poeta faz
argamassa de sujeitos.
Perfura o túnel do
complemento...o imperativo
Eleva-se rápido. E
varre fantástica paisagens do
[discurso
sopra por sete tubas de
Hidra. Tombam nuvens ao
[fundo
e escorre azul.
Investem montes couraçados.
Assim desabrochamos ao
brilho da luz de Maio de um
[sobremundo.
DIE NEUE SYNTAX
Johannes R. Becher
Die Adjektiv-bengalischen-Schmetterlinge
Sie kreisen tönend um des Substantivs erhabenen
[Quaderbau.
Ein Brückenpartizip muβ schwingen! schwingen!!
Derweil das kühne Verb sich klirrend Aeroplan in
Höhen schraubt.
Artikeltanz zückt
nett die Pendelbeinchen.
In Kicherrhythmen
schaukelt ein Parkett.
Da aber springt
metallisch tönend eine reine
Strophe heraus aus dem Trapez. Die Kett
Der Straβenbogenlampen
ineinander splittern.
Trotzt jener
buntesten Dame heiligem Vokativ.
Ein junger Dichter
sich Subjekte kittet.
Bohrt des Objekts
Tunnel...Imperativ.
Schnellt steil
empor. Phantastische Sätzelandschaft
[überzüngelnd.
Bläst sieben
Hydratuben. Das Gewölke fällt.
Und
Blaues flieβt. Geharnischte Berge
dringen.
So
blühen auf wir in dem Glanz mailichter Überwelt.
GEORG TRAKL
Nasceu em Salzburg a 3 de Fevereiro de 1887, onde passou a infância. Seguiu a carreira de farmácia, depois de um estágio de três anos em Viena. Mais tarde ingressaria nos serviços farmacêuticos do exército. Entre 1912 e 1914 viveu principalmente em Innsbruck, em casa do amigo Ludwig von Ficker. No fim de Agosto de 1914 foi enviado para a frente de combate na Galícia. Mas o poeta não estava à altura de enfrentar os aspectos sombrios da guerra. Foi internado no hospital de Cracóvia, onde faleceu na noite de 3 para 4 de Novembro, depois de ter ingerido uma fortíssima dose de cocaína. Trakl teve uma existência agitada e nos últimos anos profundamente amargurada. Os primeiros contatos poéticos foram com Rimbaud, Baudelaire e Dostoiewsky. Teve com a irmã uma relação incestuosa, sendo ambos viciados em drogas. Possuía uma sensualidade exarcebada e uma religiosidade espontânea que são os fundamentos da sua poesia, em que estão patentes o medo do mundo, o sentimento da melancolia e aspectos de uma realidade demoníaca. Escreveu o poema mais completo do Expressionismo, “Grodek”, que fala dos horrores da Primeira Guerra. Modesto Carone destaca a autonomia das imagens visuais marcadas pelo uso original do adjetivo de cor.
O SOL
Georg Trakl
Diariamente, o sol amarelo vem por cima do monte.
Bela é a floresta, o animal sombrio,
O homem: caçador ou pastor.
Fulvo, emerge o peixe no lago verde.
Sob a curva do céu
Desliza levemente o pescador no barco azul.
Lentamente, amadurece a uva, o trigo.
Quando, no silêncio, declina o dia,
Obras boas e más estão preparadas.
Quando chega a noite
O viajante ergue levemente as pesadas pálpebras;
De sombrio abismo jorra sol.
DIE
SONNE
Georg Trakl
Täglich kommt die gelbe
Sonne über den Hügel.
Schön ist der Wald, das
dunkle Tier,
Der Mensch; Jäger oder
Hirt.
Rötlich steigt im
grünen Weiher der Fisch.
Unter dem runden Himmel
Fährt der Ficher leise
im blauen Kahn.
Langsam reift die
Traube, das Korn.
Wenn sich stille der
Tag neigt,
Ist ein Gutes und Böses
bereitet.
Wenn es Nacht wird,
Hebt der Wanderer leise
die schweren Lider;
Sonne aus finsterer
Schlucht bricht.
LAMENTO
Georg Trakl
Sono e morte, as sombrias águias
Esvoaçam toda a noite ao redor desta cabeça:
A vaga gelada da eternidade
Engolindo a imagem dourada
Do homem. Em tenebrosos recifes
Despedaça-se o corpo purpúreo
E a voz grave lamenta-se
Sobre o mar.
Irmã de amotinada melancolia
Olha, um barco receoso afunda-se
Sob estrelas,
Sob o rosto silencioso da noite.
KLAGE
Georg Trakl
Schlaf
und Tod, die düstern Adler
Umrauschen
nachtlang dieses Haupt:
Des
Menschen goldnes Bildnis
Verschlänge
die eisige Woge
Der
Ewigkeit. An schaurigen Riffen
Zerschellt
der purpune Leib
Und
es klagt die dunkle Stimme
Über
dem Meer.
Schwester
stürmischer Schwermut
Sieh
ein ängstlicher Kahn versinkt
Unter
Sternen,
Dem schweigenden
Antlitz der Nacht.
GRODEK
GRODEK
Georg Trakl
Ao entardecer, as florestas outonais
Ecoam de armas mortíferas, e as planícies
douradas
E os
lagos azuis, por sobre os quais rola
Um sol sombrio; a noite abraça
Guerreiros moribundos, o lamento selvagem
Das suas bocas destroçadas.
Mas, em silêncio, num fundo de salgueiros,
Juntam-se nuvens rubras, onde um Deus irado
habita;
E o sangue derramado; e frescura lunar;
Todos os caminhos desembocam em negra podridão.
Sob dourada ramagem da noite e sob estrelas
A sombra da irmã vacila pelo bosque de
silêncio,
Para saudar os espíritos dos heróis, as cabeças
[ensangüentadas;
e levemente, nos canaviais, soam as flautas
sombrias
[do outono.
Oh, dor orgulhosa! Vós, brônzeos altares,
Uma dor portentosa alimenta hoje a chama
escaldante
[do espírito,
Os filhos que ainda vão nascer.
GRODEK
Georg Trakl
Am
Abend tönen die herbstlichen Wälder
Von
tödlichen Waffen, die goldnen Ebenen
Und
blauen Seen, darüber die Sonne
Düstrer
hinrollt; umfängt die Nacht
Sterbende
Krieger, die wilde Klage
Ihrer
zerbrochenen Münder.
Doch
stille sammelt im Weidengrund
Rotes
Gewölk, darin ein zürnender Gott wohnt
Das
vergossne Blut sich, mondne Kühle;
Alle
Straβen münden in schwarze Verwesung.
Unter
goldnem Gezweig der Nacht und Sternen
Es
schwankt der Schwester Schatten durch den
[schweigenden Hain,
Zu
grüβen die Geister der Helden, die blutenden Häupter;
Und
leise tönen im Rohr die dunkeln Flöten des Herbstes.
O
stolzere Trauer! Ihr ehernen Altäre,
Die
heiβe Flamme des Geistes nährt heute ein
[gewaltiger Schmerz,
Die ungebornen
Enkel.
ELSE
LASKER-SCHÜLER
Nasceu em Elberfeld a 11 de fevereiro de 1869. Judia,
casou-se em 1894 com um médico, em Berlim, o Dr. Berthold Lasker. Os seus
primeiros poemas aparecem em 1899, na revista Gesellschft (A Sociedade), fazendo a sua estréia num círculo
literário de Berlim. Entre 1901 e 1911 esteve casada em segunda núpcias, com
Herwarth Walden, acompanhando o início da sua carreira literária e a fundação
da revista Der Sturm. No período expressionista entrou em contato com a nova
geração de poetas; conviveu com Gottfried Benn, Franz Werfel, Franz Marc, Georg
Trakl e Karl Kraus. Em 1925 cortou relações com seus editores e depois disso
poucas publicações suas apareceram. Recebeu o prêmio Kleist em 1932. Em 1933
fugiu para a Suíça. Fixou-se, mais tarde, na Palestina, onde viveu na maior
miséria até a morte. A última publicação em vida é de 1943, com o livro de
poemas Mein Blaues Klavier (O Meu Piano Azul). Morreu em Jerusalém,
a 22 de janeiro de 1945 e foi sepultada no Monte das Oliveiras. Considerada a
maior poeta do Expressionismo e uma das melhores de língua alemã. Seu tema é um
só: os movimentos e os sofrimentos do amor em uma poesia espontânea, suave e
melódica.
UMA CANÇÃO
Else Lasker-Schüler
Por detrás dos meus olhos há águas
Tenho que as chorar todas.
Tenho sempre um desejo de me elevar voando,
E de partir com as aves migratórias.
Respirar cores com os ventos
Nos grandes ares.
Oh, como estou triste...
O rosto da lua bem o sabe.
Por isso, à minha volta há muita devoção aveludada
E madrugada a aproximar-se.
Quando as minhas asas se quebraram
Contra o teu coração de pedra,
Caíram os melros, como rosas de luto,
Dos altos arbustos azuis.
Todo o chilreio reprimido
Quer jubilar de novo
E eu tenho um desejo de me elevar voando,
E de partir com as aves migratórias.
EIN LIED
Else Lasker-Schüler
Hinter meinen Augen
stehen Wasser,
Die muβ ich alle weinen.
Immer möchte ich
auffliegen
Mit den Zugvögeln fort,
Buntatmen mit den
Winden
In der groβen Luft.
O ich bin so traurig...
Das Gesicht im Mond weiβ es.
Drum ist viel sammtne
Andacht
Und nahender Frühmorgen
um mich.
Als an deinem steinernen
Herzen
Meine Flügel brachen,
Fielen die Amseln wie
Trauerrosen
Hoch vom blauen
Gebüsch.
Alles verhaltene
Gezwitscher
Will wieder jubeln
Und ich möchte
auffliegen
Mit den Zugvögeln fort
DESPEDIDA
Else Lasker-Schüler
Mas tu nunca vinhas com a noite –
E eu sentada com casaco de estrelas.
...Quando batiam à minha porta
Era o meu próprio coração.
Agora pendurado em todas as ombreiras,
Também na tua porta;
Entre touros rosa-de-fogo a extinguir-se
No castanho da grinalda.
Tingi-te o céu de groselha
Com o sangue do meu coração.
Mas tu nunca vinhas com a noite –
... E eu de pé com sapatos dourados.
ABSCHIED
Else Lasker-Schüler
Aber du kamst nie mit
dem Abend –
Ich saβ im Sternenmantel.
...Wenn es an mein Haus
pochte,
War es mein eigenes
Herz.
Das hängt nun na jedem Türpfosten,
Auch an deiner Tür;
Zwischen Farren
verlöschende Feuerrose
Im Braun der Girlande
Ich färbte dir den
Himmel brombeer
Mit meinem Herzblut.
Aber du kamst nie mit
dem Abend –
...Ich stand in
goldenen Schuhen.
JAKOB VAN
HODDIS
(Pseudônimo de Hans
Davidson). Nasceu em Berlim e estudou de 1906 a 1912 em Munique, Iena e Berlim,
primeiro arquitetura e depois grego e filosofia. Fundou em 1909 o Neur Club (Novo Clube) do qual nasceu
depois o Neopathetisches Cabaret (Cabaré Neopatético). A sua pequena estatura,
que o atormentaria toda a vida, e suas paixões não retribuídas por Lotte
Pritzel, e depois pela poetisa Emmy Hennings foram responsáveis pelos primeiros
indícios de desequilíbrio psíquico, que se manifestaram em 1912. Depois de
melhoras passageiras é internado em 1914, as suas perturbações continuam a
agravar-se, e acaba por voltar a ser internado na casa de saúde Bendorf-Sayn em
Coblença, da qual é levado em 1942, para ser morto, provavelmente, em uma
câmara de gás de um campo de concentração nazista. Perdeu-se grande parte das
suas poesias e quase toda a sua prosa. Os recursos poéticos utilizados por
Hoddis levam a refletir sobre o papel do louco e da loucura na poesia, evidente
no poema O Visiotário.
O
VISIOTÁRIO
Jakob van Hoddis
(1918)
Jakob van Hoddis
(1918)
Lâmpada, não esquente.
Da parede saiu um braço magro de mulher.
Era pálido e tinha veias azuis.
Os dedos estavam carregados de preciosos anéis.
Quando beijei a mão, assustei-me:
Estava viva e quente.
Arranhou-me o rosto.
Peguei uma faca de cozinha e cortei algumas veias.
Um grande gato lambeu graciosamente o sangue do chão.
Entretanto um homem de cabelos arrepiados subiu
Por um
cabo da vassoura encostado à parede.
DER VISIONARR
Jakob
van Hoddis
(1918)
Lampe blöck nicht.
Aus der Wand fuhr ein dünner Frauenarm.
Er war bleich und blau geädert.
Die Finger waren mit kostbaren Ringen bepatzt.
Als ich die Hand küβte, erschrak ich:
Sie war lebendig und warm.
Das
Gesicht wurde mir zerkratzt.
Ich nahm ein Küchenmesser und zerschnitt ein paar
[Adern.
Eine groβe Katze leckte zierlich
das Blut vom Boden
[auf.
Ein Mann indes kroch mit gestäubten Haaren
Einen schräg an die Wand gelegten Besenstiel hinauf.
WILHELM KLEMM
Nasceu em Lípsia, filho de um livreiro; depois
de cumprido o serviço militar, estudou Medicina em Munique, Erlangen, Lípsia,
Kiel. Terminou o curso em 1905, e exerceu a sua profissão em vários lugares. Em
1909, ocupou-se da firma Otto Klemm, herdada de seu pai. Casou-se em 1912 com
Erna Kröner. De 1914 a 1918 foi tenente médico da frente ocidental. Inicia-se
uma atividade editorial em 1918, e em 1921 assume a direção da editora Kröner.
Não publica a partir de 1922. Foi
perseguido pelos Nazis e teve seus negócios destruídos em 1943.
PROGRAMA
Wilhelm Klemm
Não
queremos poesia,
Queremos
mágicas, artifícios,
Procuramos
tapar na existência fatais vazios
E apesar
de imenso esforço, uma atrofia.
Mas o que sabem vocês outros da secreta elevação,
Dos sagrados e histéricos soluços da garganta a chorar,
Mas o que sabem vocês outros da secreta elevação,
Dos sagrados e histéricos soluços da garganta a chorar,
Quando,
consumidos pelo haxixe da alma em imersão,
Beijamos
o primeiro degrau, para além de cujo limiar
Os deuses
moram?
PROGRAMM
Wilhelm Klemm
Wilhelm Klemm
(1915)
Wir wollen keine
Poesie,
Wir wollen Taschenzauberkunststücke,
Wir suchen im Dasein
eine fatale Lücke
Zu stopfen. Trotz
krampfhafter Mühe gelingt es nie.
Aber was wiβt
ihr anderen von den heimlichen
[Elevationen,
Von dem selig
hysterischen Schluchzen der Kehle,
Wenn wir die erste
Stufe, über deren äonen –
Haften Folge die Götter
wohnen,
Küssen, ganz verzehrt
von dem Haschisch innrer Seele?
PAUL ZECH (1881-1946)
Nasceu em Briesen, na Prúsia Ocidental, em 19
de fevereiro de 1881. Passou a juventude em Wuppertal. Estudou em Bonn,
Heidelberg e Zurique. Trabalhou como mineiro e metalúrgico, por idealismo social,
na Alemanha, França e Bélgica. Tornou-se editor e colaborador de vários
jornais, traduziu vários poetas franceses, ao mesmo tempo que começava, na
volta do século, a sua própria produção poética. Foi amigo de Richard Dehmel,
Emil Verhaeren, Else Lasker-Schüler, Stefan Zweig, Georg Heym e Apollinaire,
entre outros. Viveu muito tempo em Berlim, foi bibliotecário e propagandista.
Em 1933, emigrou para Praga, depois Paris, e finalmente, para a Argentina, onde
morreu, em 7 de setembro de 1946, em Buenos Aires. É o menos flexível dos
poetas da sua geração. O poema selecionado é um raro soneto expressionista
sobre a dureza de uma rua industrial em uma cidade grande.
RUA INDUSTRIAL, DE DIA
Só
paredes, sem verde nem vidraça,
A rua
estende a cintura malhada
Das
fachadas. Os carris sem zoada.
Brilha o
asfalto molhado da praça.
Roça por
ti alguém, um frio olhar
Penetra-te
a medula; passos duros
Fazem
saltar faíscas de altos muros
E fica a
nuvem de um breve respirar.
Não há
cela que aperte o pensamento
Em gelo como
este caminhar
Entre
muros, que só muros podem olhar.
Vistas tu
penitência ou sacro pensamento -:
Esmaga-te
sempre o pesado sudário
Do
anátema divino: turno sem horário.
FABRIKSTRAβE TAGS
Paul Zech
Nichts als Mauern. Ohne Gras und Glas
zieht die Straβe den gescheckten Gurt
der Fassaden. Keine Bahnspur surrt.
Immer glänzt das Pflaster wassernaβ.
Streift ein Mensch dich, trifft sein Blick dich kalt
bis ins Mark; die harten Schritte haun
Feuer aus dem turmhoch steilen Zaun,
noch sein kurzes Atmen wolkt geballt.
Keine Zuchthauszelle klemmt
in ein Eis das Denken wie dies Gehn
zwischen Mauern, die nur sich besehn.
Trägst Du Purpur oder Büβerhemd - :
immer drückt mit riesigem Gewicht
Gottes Bannfluch: uhrenlose Schicht.
GEORG HEYM
Nasceu em 30 de outubro de 1887 em Hirschberg.
Filho de um advogado militar, com ambiente familiar burguês e intelectualmente
pouco aberto, o que cedo levou a tensões e desentendimentos com os pais. De 1905
a 1909 estudou no liceu de Neuruppin. Entre 1907 e 1910 estudou direito em
Wurzburg e Berlin. A 6 de julho de 1910 fez sua primeira leitura no Cabaré
Neopatético, de Kurt Hiller. Em 1 de outubro do mesmo ano publicou o primeiro
poema no Herold e em 23 de Novembro
no Demokrat. Em 16 de janeiro de 1912
morreu afogado no rio Havel, com o seu amigo Ernst Balcke, quando praticavam
patinagem no gelo. Foi praticamente o primeiro poeta expressionista. “Irmão” de
Poe e de Baudelaire, foi um sacerdote dos horrores quando pinta a grande
cidade.
O DEUS DA
CIDADE
Georg
Heym
Escarrapachado
sobre um quarteirão,
À sua
volta acampam negros ventos.
Ele olha
irado, ao longe, a solidão
De
últimas casas em campos nevoentos.
Baal ao
pôr-do-dol, pança luzindo,
À volta
ajoelham as grandes cidades.
De um mar
de negras torres vem subindo
O eco
monstruoso das trindades.
Na rua, a
multidão música entoa,
Em dança,
coribântica exaltada.
Das
chaminés fabris o incenso escoa
E sobe
até ele, em fragrância azulada.
No seu
sobrolho crepitam temporais.
Narcotiza-se
em noite o escuro dia.
Como os
abutres, esvoaçam vendavais
Em
cabeleira irada, que arrepia.
Estende
no escuro a mão do carniceiro.
Um mar de
fogo varre, num estremecer,
Toda uma
rua, que acaba num braseiro,
Até que o
dia tarde a amanhecer.
DER GOTT DER STADT
Georg Heym
Auf einem
Häuserblocke sitzt er breit.
Die Winde
lagern schwarz um seine Stirn.
Er schaut
voll Wut, wo fern in Einsamkeit
Die letzen Häuser in das Land verirrn.
Vom Abend glänzt der rote Bauch dem Baal,
Die grossen Städte knien um ihn her.
Der
Kirchenglocken ungeheure Zahl
Wogt auf
zu ihm aus schwarzer Türme Meer.
Wie Korybanten-Tanz dröhnt die Musik
Der Millionen durch die Strassen laut.
Der Schlote Rauch, die Wolken der Fabrik
Ziehn auf zu ihm, wie Duft von Weihrauch blaut.
Das Wetter schwelt in seinen Augenbrauen.
Der dunkle Abend wird in Nacht betäubt.
Die Stürme flattern, die wie Geier schauen
Von
seinem Haupthaar, das im Zorne sträubt.
Er streckt ins Dunkel seine Fleischerfaust.
Er schüttelt sie. Ein Meer von Feuer jagt
Durch eine Strasse. Und der Glutqualm braust
Und frisst sie auf, bis spät der Morgen tagt.
BIBLIOGRAFIA
ARGAN, Giulio Carlo. Arte
Moderna. Trad. Denise Bottman e Federico Carotti. São Paulo, Companhia das
Letras, 1992.
BARRENTO, João. Expressionismo Alemão Antologia Poética.
Seleção, tradução introdução e notas de João Barrento. Lisboa : Ática Sarl,
1980.
BENJAMIM, Walter. Obras Escolhidas. Magia e Técnica Arte e
Política. São Paulo : Brasiliense, 1985.
BRANDÃO, Junito de Souza Dicionário Mítico-Etimológico da Mitologia Grega. Petrópolis, RJ : Vozes, 1991.
CARONE, Modesto. Georg Trakl : Declínio e Utopia. Folha de São Paulo, Caderno de
Letras, 16/01/86.
DE MICHELI, Mario. As Vanguardas Artísticas do Século XX. Trad. Pier Luigi Cabra. São
Paulo : Martins Fontes,1991.
DÖBLIN,
Alfred. Berlin Alexanderplatz 24ª
ed. München : Deustches Taschenbuch Verlag,
1980.
ELGER,
Dietmar. Expressionism : A Revolution in German Art. Köln : Benedikt Taschen,
1994.
KAFKA, Franz. Cartas à Milena. Trad. Torrieri
Guimarães. São Paulo : Exposição do Livro, 198-.
______Metamorfose. Trad.
Modesto Carone. São Paulo : Nova Fronteira, 1990.
______O Processo. Trad. Maria José Fabião.
Lisboa : Europa-América, 1976.
______O Castelo. Trad. Maria Helena Rodrigues
de Carvalho. Lisboa : Europa-América, 198-..
LANGENBUCHER, Wolfgang. Antologia Humanística Alemã - Ein Deutsches Lesebuch, Trad. Ari
Lazzari e outros. Porto Alegre : Globo, Tübingen-Basel,
1972.
LE RIDER, Jacques. A Modernidade Vienense e as Crises de Identidade. Trad. Elena
Gaidano. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira,
1993.
NIETZSCHE, Friedrich W. Assim Falava Zaratustra. Trad. Eduardo Nunes Fonseca. São Paulo : Hemus, 198-..
RIMBAUD, Jean Arthur. Uma temporada no Inferno & Iluminações.
4. ed.. Tradução, introdução e notas de Lêdo Ivo. Rio de Janeiro : Francisco
Alves, 1993.
ROTHE, Wolfgang. Expressionismus Als Literatur. Bern und Mûnchen : Franke Verlag, 19-?.
TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda Européia e Modernismo Brasileiro. Petrópolis : Vozes, 1972.
VAN GOGH, Vincent. Cartas a Theo. Trad. Pierre Ruprecht. 4ª ed. Porto
Alegre : L& PM. 1991.
Comentários
Postar um comentário