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NA LASSIDÃO SOMOS MAIS SINCEROS

Escrevo porque é a vida e não porque é literatura, o verso está no que a poesia quer e não no que o poeta diz. E assim, as palavras se arrumam.
A verdade está no que se compartilha.
Usar os olhos, a intuição, o pressentir. Só conheces a ação? Muito bem, recuar aqui pode ser uma forma de avançar. Quem vai dizer essa ordem não é alguém superior: és tu e tua solidão. Tu e tua coragem, esse teu pequeno escudo na língua que falas e que agora escreves.
Dizer é uma parte da linguagem, a outra é ouvir. E o coração fala mais que a língua que se diz dizer, o coração é o reduto da alegria e essa euforia contagia, é o coração que gosta do diálogo, mas a minha escrita quer a pele, quer essa obscura geometria de animais desenhada no teu e no meu corpo.
Não é porque te chamo de “Ninguém” que não existes. Às vezes é o oposto, sou eu que pareço não existir, por isso exijo que meu pensamento pense em ti. Agora terei uma responsabilidade, a de escrever, já que escrever não é só pensar, mas também se expor ao sentir. Estou tão vulnerável que minha sentinela é algo como uma sombra tua que, de longe, me acena um gesto que não identifico.
Vou começar dizendo que me eduquei para aprender a dominar as ilusões, pois que estamos cercados delas. Acredito que no perder está alguma coisa mais sincera, pelo menos direi isso a seguir, pois a escrita é sempre algo que perdemos, e nesse esforço, penso que estou a abrir mais espaço e para descobrir que o esforço compensa um novo caminho.
Escrever é exercitar a arte do ilusório, já que não há o texto definitivo, assim como não há a crença definitiva, ou o livro definitivo, o homem definitivo,  e a pessoa que ali vai já dobrou a esquina e sequer uma sombra a define.
Só há o cansaço em que nos abandonamos. Talvez, assim podemos ser nós mesmos.

Na lassidão somos mais sinceros.


Benilton Cruz

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